Há temas que quase toda pessoa, seja católica ou não, gosta de se posicionar. Alimentar discussões e polêmicas. Entre eles o celibato sacerdotal e o direito das mulheres celebrarem missas. Já o Vaticano costuma tratar os assuntos com certo cuidado. E poucas vozes da Igreja, nas últimas décadas, ousaram contribuir com o debate fora das paredes dos seminários e das cúrias. O bispo emérito da Diocese de Nova Friburgo (Rio de Janeiro), dom Clemente Isnard, resolveu derrubar tais barreiras. Aos 90 anos e reconhecido internacionalmente por seu trabalho no campo litúrgico, ele lança hoje o livro - Reflexões de um bispo sobre as instituições eclesiásticas atuais - que promete jogar lenha na fogueira. E não fala apenas do celibato e das mulheres, trata de um dos pontos quase intocável no Vaticano: a participação dos leigos na escolha dos bispos. O lançamento nacional ocorre às 19h na Igreja das Fronteiras, bairro do Derby. Um sinal de reconhecimento ao trabalho feito por dom Helder Camara. "Fala-se tanto na faltade sacerdotes, nas paróquias sem padres, nos padres que se secularizaram deixando o ministério. E não se pensa nos padres de valor e que se casaram e que poderiam ter continuado no ministério se a Igreja lhes tivesse concedido matrimônio", argumentou o bispo emérito. Dom Isnard encontra justificativa para seu posicionamento na experiência. Foram mais de 30 anos à frente da Diocese Nova Friburgo. E também no conhecimento histórico. Ele lembra que a exigência do celibato apareceu pela primeira vez por volta do ano 300, mas que ainda hoje as igrejas orientais católicas permitem que padres se casem. Segundo o religioso, a multiplicação dos diáconos permanentes é um sinal de que o padre casado seria bem aceito em muitos lugares. Os diáconos são homens casados ou celibatários que podem pregar, mas não estão autorizados a consagrar a hóstia e o vinho.Dom Isnard recorre ao olhar de pastor para se posicionar em defesa das mulheres. "Em minha longa vida conheci padres incapazes de ser párocos e conheci também religiosas e leigas consagradas com capacidade de dirigir comunidades", testemunhou. Para o monge beneditino, a dispensa do celibato não é uma mudança teológica, mas disciplinar. E sugere a necessidade de se analisar a Bíblia, quando São Paulo afirma que todos - judeu e grego, servo e livre, macho e fêmea - são iguais perante Deus. "Esse me parece um poderoso argumento bíblico em favor da ordenação de mulheres", acredita.As análises do autor se voltam também para a eleição dos bispos. "Em nossos dias o povo não é ouvido na eleição, mas pode se manifestar na hora do enterro", afirma, lembrando que a participação dos leigos nas eleições era comum no primeiro milênio de existência da instituição. Essa a prática foi caindo em desuso com a crescente interferência dos reis. Diante do que viveu e conhece, o bispo emérito defende que o ideal seria voltar ao regime do primeiro milênio, onde bispos, clero e povo participavam das escolhas. O povo, exemplifica, seria homens e mulheres engajados na Igreja, idosos e jovens, em número que expressasse as duas categorias E conclui, de maneira incisiva que a "descentralização das nomeações episcopais traria um alívio notável para as finanças da Sé Apostólica, uma vez que o pessoa da nunciatura não precisaria ser tão numeroso". Coicindência ou não, dom Isnard contou que uma cópia do seu livro foi entregue ao núncio apostólico no Brasil antes da publicação. E esse teria pedido a Editora Paulus, com quem estava outra cópia do texto, para não publicar o livro.Ainda sobre os bispos, dom Isnard se pergunta como recuparar um episcopado zeloso, culto e avançado. Ele mesmo responde que na situação atual seria necessário um novo concílio ecumênico para completar o Vaticano II, realizado entre 1962 e 1965 e responsável por mudanças na Igreja. Uma delas foi permitir a celebração das missas em diversas línguas, acabando com a ditadura do latim. Mesmo apontando o caminho, o bispo emérito acredita que dificilmente haveriam mudanças hoje. Isso porque a Cúria Romana prepara e redige tudo.
Fonte: http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=14712
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